domingo, 28 de fevereiro de 2010

Os Sofistas

O Século de PÉRICLES (V a.C.) constitui o período áureo da cultura grega, quando a democrática Atenas desenvolve intensa vida cultural e artística. Os pensadores do período clássico, embora ainda discutam questões referentes à natureza, desenvolvem o enfoque antropológico, que abrange a moral e a política.

Os sofistas vivem nessa época, e alguns deles são interlocutores de Sócrates. Os mais famosos foram: Protágoras de Abdera (485-411 a.C.); Górgias, de Leôncio, na Sicília (485-380 a.C.); Híppias, de Élis; e ainda Trasímaco, Pródico, Hipódamos, entre outros. Tal como ocorreu com os pré-socráticos, dos sofistas, só nos restam fragmentos de suas obras, além das referências - muitas vezes tendenciosas - feitas por filósofos posteriores.

A palavra sofista, etimologicamente, vem de sophos, que significa "sábio", ou melhor, "professor de sabedoria". Posteriormente adquire o sentido pejorativo daquele que emprega sofismas, ou seja, alguém que usa do raciocínio capcioso, de má-fé, com intenção de enganar. Sóphisma significa "sutileza de sofista".

Os sofistas sempre foram mal interpretados por causa da críticas que a eles fizeram Sócrates e Platão. A imagem de certa forma caricatural de sofística tem sido reelaborada na tentativa de resgatar a sua verdadeira importância. Desde que os sofistas foram reabilitados por Heigel no século XIX, o período por eles iniciado passou a ser denominado Aufklarung grega, imitando a expressão alemã que designa o Iluminismo Europeu do século XVIII.

São muitos motivos que levaram à visão deturpada sobre os sofistas que a tradição nos oferece. Em primeiro lugar, há enorme diverside teórica entre os pensadores reunidos sob a designação de sofista. Talvez o que possa identificá-los é o fato de serem considerados sábios e pedagogos. Vindos de todas as partes do mundo grego, ocupam-se de um ensino itinerante pelos locais em que passam, mas não se fixam em lugar algum. Deve-se a isso o gosto pela crítica, o exercício de pensar resultante da circulação de ideias diferentes.

Segundo Jaeger, historiador da filosofia, os sofistas exercem influência muito forte, vinculando-se à tradição educativa dos poetas Homero e Hesíodo. Os sofistas dão importante contribuição para a sistematização do ensino, formando um currículo de estudos: Gramática (da qual são os iniciadores), retórica e dialética; por influência dos pitagóricos, desenvolvem a aritimética, a geometria, a astronomia e a música.

Para escândalo de seus contemporâneos, costumavam cobrar pelas aulas e por esse motivo Sócrates os acusa de "prostituição". Cabe aqui um reparo: na Grécia antiga, apenas a aristocracia se ocupava com o trabalho intelectual, pois gozava do ócio, ou seja, da disponibilidade de tempo, já que o trabalho manual, de subsistência, era ocupação de escravos. Ora, os sofistas, geralmente pertencentes à classe média, fazem das aulas seu ofício, por não serem suficientemente ricos para se darem ao luxo de filosofarem. Se alguns sofistas de menor valor intelectual pudessem ser chamados de "mercenários do saber", isso na verdade era acidental, não se aplicando à maioria.

Os sofista elaboraram o ideal teórico da Democracia, valorizada pelos comerciantes em ascenção, cujos interesses passam a se contrapor aos da aristocracia rural. Nessas circunstâncias a exigência que os sofistas vêm satisfazer é de ordem essencialmente prática, voltada para a vida, pois iniciam os jovens na arte da retórica, instrumento indispensável na assembleia democrática, e os deslumbram com o brilhantismo da participação no debate público.

Se forem acusados pelos seus detratores de pronunciarem discursos vazios, essa fama se deve à execiva atenção dada por alguns deles ao aspecto formal da exposição e da defesa da ideias, na medida em que se acham convencidos de que a persuasão é o instrumento por excelência do cidadão na cidade democrática. Os melhores deles, no entanto, buscam aperfeiçoar os instrumentos da razão, ou seja, a coerência e o rigor da argumentação porque não basta dizer o que se considera verdadeiro, é preciso demonstrá-lo pelo raciocínio. Pode-se dizer que aí se encontra o embrião da lógica, mais tarde desenvolvida por Aristóteles.

Quando Protágoras, um dos mais importantes sofistas, diz que "o homem é a medida de todas as coisas", esse fragmento deve ser entendido não como expressão do relativismo do conhecimento, mas como exaltação da capacidade de construir a verdade: o logos não mais é divino, mas decorre do exercício técnico da razão humana.

Texto retirado de: Filosofando Introdução à filosofia. Maria Lúcia de Arruda Aranha e Maria Helena Pires Marins. Editora Moderna.

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